quinta-feira, 4 de junho de 2015

X - O País dos Brinquedos - Pinóquio

A Fada disse a Pinóquio:
— Pode convidar seus colegas para o café-da-manhã de amanhã. Mas lembre-se de estar em casa antes que escureça. Entendeu?
— Prometo estar de volta daqui a uma hora — respondeu a marionete.
Cantando e dançando, Pinóquio saiu porta afora. Em pouco mais de uma hora, todos os seus amigos foram convidados. Alguns aceitaram imediatamente, outros se fizeram um pouco de rogados, mas, quando souberam que os pãezinhos levariam manteiga dos dois lados, acabaram todos por dizer: "Nós também vamos, para lhe agradar".
Entre os amigos e colegas de escola, Pinóquio tinha um preferido, que todos chamavam de Pavio, devido ao corpo magro, enxuto e alto, tal qual o pavio novo de uma vela.
Pavio era o garoto mais preguiçoso e levado de toda a escola, mas Pinóquio gostava muito dele. Assim, foi logo procurá-lo em casa, a fim de convidá-lo, e só o encontrou escondido debaixo do alpendre de uma casa.
— Você já sabe do grande acontecimento? — perguntou Pinóquio.
— Que acontecimento?
— Amanhã deixo de ser marionete e me torno um menino como você e como todos os outros. Quero ver você na minha casa para o café-da-manhã.
— Mas vou viajar hoje à meia-noite...
— E aonde você vai?
— Vou morar no país mais bonito deste mundo!... É o País dos Brinquedos. Por que você não vem também?
— Eu? Não mesmo!
— Acredite em mim, Pinóquio, se você não vier, vai se arrepender. Onde acha que vai encontrar um país mais sadio para nós, meninos? Lá não existem escolas, nem professores, nem livros. Naquele país abençoado nunca se estuda. As férias começam no dia primeiro de janeiro e acabam no último dia de dezembro.
Assim deveriam ser todos os países civilizados!...
— Mas o que se faz o dia inteiro no País dos Brinquedos?
— São diversões e brincadeiras de manhã à noite. Depois, à noite, vai-se para a cama.
E na manhã seguinte recomeça-se tudo de novo. Que tal?
— Uhm!... — fez Pinóquio.
— Então, quer ir comigo? Quer ou não quer? Decida.
— Não, não, não. Agora já prometi à minha Fada que vou me tornar um menino bem-comportado, e quero manter a promessa.
— Espere mais dois minutos.
— Vai ficar tarde.
— Só dois minutos.
— E como é que você faz? Vai sozinho ou com alguém?
— Vamos ser mais de cem meninos. Daqui a pouco vai passar por aqui a carroça que vem me pegar e me levar até aquele país maravilhoso.
— Você tem mesmo certeza — perguntou Pinóquio — de que nesse país não existe escola nenhuma?...
— Nem sombra.
— Que beleza de país... — disse Pinóquio com água na boca. — Mas não adianta ficar me tentando! Já prometi à minha Fada querida que vou me tornar um menino ajuizado.
— Então adeus, e lembranças à escola.
— Adeus, Pavio. Boa viagem. Divirta-se e lembre-se de vez em quando dos amigos.
Dizendo isso, a marionete deu dois passos como se estivesse indo embora, mas logo, parando e voltando-se para o amigo, perguntou:
— Mas você tem mesmo certeza de que nesse país as férias começam no primeiro de janeiro e acabam no último dia de dezembro?
— Tenho!
— Se faltasse só uma hora para a partida, eu era capaz de esperar.
— E a Fada?
— Agora já me atrasei!... E voltar para casa uma hora antes ou uma hora depois dá na mesma.
À meia-noite, viram mover-se ao longe uma luzinha... e ouviram um som de guizos e um tênue toque de trombeta.
— É a carroça que vem me buscar — gritou Pavio. — Então, quer vir, sim ou não?
— Mas é verdade mesmo — perguntou a marionete — que nesse país os meninos nunca são obrigados a estudar?
— Nunca! Nunquinha!
— Que beleza de país!...
A carroça já estava cheia de garotos entre os oito e os doze anos, amontoados uns por cima dos outros como sardinhas em lata. Iam apertados, quase não conseguiam respirar, mas ninguém se queixava. O consolo de saber que chegariam a um país onde não havia nem livros, nem escolas, nem professores os punha tão contentes e resignados que não percebiam nem o desconforto, nem o cansaço, nem a fome, nem a sede, nem o sono.
Assim que a carroça parou, Pavio, de um salto, montou a cavalo no varal.
— E você?... — disse o cocheiro cheio de delicadeza para Pinóquio. — Vem com a gente ou fica?...
— Pinóquio! — disse Pavio.— Acredite em mim, venha com a gente e vamos nos divertir.
— Venha com a gente e vamos nos divertir — gritaram todas juntas uma centena de vozes, de dentro da carroça.
— E se eu for com vocês, o que é que a minha boa Fada vai dizer? — disse a marionete.
— Não encha a cabeça com essa melancolia toda. Pense que vamos para um país onde podemos brincar e gritar da manhã à noite!
Pinóquio não respondeu, mas deu um suspiro. Depois de três suspiros, finalmente disse:
— Arrumem um lugarzinho para mim. Eu também quero ir!...
No dia seguinte, ao alvorecer, chegaram alegremente ao País dos Brinquedos.
Esse país não se assemelhava a nenhum outro país do mundo. A população era toda composta de crianças. Os mais velhos tinham catorze anos, os mais jovens, só oito. Nas ruas, uma alegria, uma barulheira, uma falação de enlouquecer!
Bandos de garotos por toda parte. Uns jogavam bolinha de gude, outros jogavam tampinhas, havia os que jogavam bola, e os que andavam de velocípede ou montavam cavalinhos de madeira. Uns brincavam de cabra-cega, outros brincavam de pique, uns vestidos de palhaços comiam estopa acesa, outros recitavam, e havia os que cantavam, os que davam saltos mortais, os que se divertiam andando com as mãos no chão e as pernas no ar, os que empurravam um aro, os que passeavam vestidos de general com elmo de papel e espada de papelão; havia quem ria, quem gritava, quem chamava, quem batia palmas, quem assoviava, quem imitava galinha botando ovo, enfim, tamanho pandemônio, tamanha gritaria, tamanha barulheira endiabrada, que teria sido preciso botar algodão nos ouvidos para não ensurdecer.
Em todas as praças viam-se teatrinhos de lona, da manhã à noite cheios de meninos, e sobre todas as paredes das casas liam-se, escritas com carvão, coisas belíssimas como: “Vamo brincá” (em vez de “Vamos brincar”)
— Que vida maravilhosa! — dizia Pinóquio cada vez que se encontrava com
Pavio.
— Está vendo como eu tinha razão? — respondia este. — E pensar que você não queria vir, que ia perder tempo estudando!...É verdade, Pavio! Se hoje sou um menino realmente feliz, devo a você.
Cinco meses haviam transcorrido nessa bela farra, quando uma manhã, ao acordar, Pinóquio teve uma péssima surpresa.




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