Chegando à praia,
Pinóquio saltou primeiro, para ajudar seu pai.
Enquanto isso, o dia
já havia clareado.
Pinóquio e Gepeto
ainda não haviam dado cem passos, quando viram sentados na beira da estrada
dois tipos mal-encarados que estavam ali pedindo esmola.
Eram o Gato e a
Raposa. Mas não se pareciam mais com os de antigamente. O Gato, de tanto se
fingir cego, havia acabado por ficar cego de verdade. E a Raposa, envelhecida,
sarnenta e paralítica de um lado, não tinha mais sequer a cauda. Pois é.
Aquela pequena ladra,
tendo caído na miséria, viu-se obrigada, um belo dia, a vender sua lindíssima
cauda a um ambulante, que a comprou para fazer um espanta-moscas.
— Oh, Pinóquio —
gritou a Raposa com voz chorosa —, faça uma caridade para estes dois pobres
enfermos.
— Enfermos! — repetiu
o Gato.
— Adeus, tratantes! —
respondeu a marionete. — Vocês me enganaram uma vez, agora não caio mais nessa.
— Acredite, Pinóquio,
hoje somos realmente pobres e desgraçados!
— Desgraçados! —
repetiu o Gato.
— Se estão pobres é
bem-merecido. Adeus, fingidos!
E dizendo isso
Pinóquio e Gepeto seguiram seu caminho. Ao fim de uma estradinha viram uma
linda cabana.
— Vamos lá bater —
disse Pinóquio.
— Quem é? — perguntou
uma vozinha de dentro.
— Somos um pobre pai
e um pobre filho, sem pão e sem abrigo — respondeu a marionete.
— Rodem a chave, que
a porta abre — disse a mesma vozinha.
Pinóquio virou a
chave, e a porta abriu-se.
— Estou aqui em cima!
Pai e filho olharam
para o teto e viram, em cima de uma viga, o Grilo-Falante.
— Oh! Grilinho
querido — disse Pinóquio educadamente.
— Agora você me chama
de “Grilinho querido”, não é? Mas está lembrado de quando me atirou um
martelo?...
— Tem razão,
Grilinho! Pode me atirar um martelo, mas tenha pena do meu pobre pai...
— Eu vou ter pena do
pai e também do filho. Mas tive que lembrá-lo de uma grave grosseria recebida,
para lhe ensinar que neste mundo, sempre que possível, temos que ser delicados
com todos, se queremos que nos retribuam com igual delicadeza nos dias de
necessidade.
— Você tem toda a
razão, Grilinho, e eu não vou esquecer a lição. Mas onde posso encontrar um
copo de leite para o meu pobre pai?
— Três campos para lá
deste, vive o hortelão Janjão, que cria vacas. Vá até lá e encontrará o leite
que procura.
Pinóquio foi correndo
até a casa do hortelão Janjão. Mas o hortelão lhe disse:
— Um copo de leite
custa um tostão.
— Não tenho nem um
centavo — respondeu Pinóquio constrangido e triste.
— Quem sabe podemos
fazer um arranjo — disse Janjão. — Você aceitaria rodar a nora?
— E o que é nora?
— É aquela engenhoca
de madeira que serve para tirar a água da cisterna, para regar as hortaliças.
— Vou tentar...
— Então, você puxa
cem baldes de água para cima, e eu lhe dou em pagamento um copo de leite.
Janjão levou a
marionete para a horta e lhe mostrou como rodar a nora.
Mas, antes mesmo de
ter puxado os cem baldes, Pinóquio estava todo ensopado de suor, da cabeça aos
pés. Nunca antes havia tido que fazer tamanho esforço.
— Até agora, quem
tinha essa trabalheira — disse o hortelão — era o meu burro. Mas hoje o pobre
bicho está no fim.
— Pode me levar para
vê-lo? — perguntou Pinóquio.
— Com prazer.
Assim que Pinóquio
entrou na estrebaria, viu um lindo burrinho deitado na palha, acabado pela fome
e pelo excesso de trabalho. E debruçando-se até ele perguntou-lhe em dialeto
asinino:
— Quem é você?
Ouvindo essa
pergunta, o burrinho abriu os olhos moribundos e respondeu gaguejando no mesmo
dialeto:
— Sou o Pa...vi...o.
E em seguida fechou
os olhos e morreu.
— Pobre Pavio! —
disse Pinóquio. E catando um punhado de palha enxugou uma lágrima que lhe
escorria pelo rosto.
A marionete pegou seu
copo de leite quase quente e voltou para a cabana.
Daquele dia em
diante, ao longo de mais de cinco meses, Pinóquio continuou levantando-se de
madrugada, antes de o sol nascer, para ir girar a nora: e assim ganhar aquele
copo de leite que tão bem fazia à saúde do seu pai. E nem se contentou com
isso, porque com o tempo aprendeu também a fabricar balaios e cestas de junco,
e com o dinheiro que ganhava com eles pagava todas as despesas diárias. Entre
outras coisas, construiu sozinho um carrinho para levar seu pai a passeio
quando o tempo estava bom. E à noite ficava acordado até tarde exercitando-se
na leitura e na escrita.
O fato é que, com seu
empenho em encontrar soluções, em trabalhar e progredir, não só havia
conseguido sustentar quase com conforto seu pai sempre adoentado, como, ainda
por cima, havia economizado quarenta tostões para comprar uma roupinha nova.
Uma manhã disse ao
pai:
— Vou até o mercado
aqui perto, para comprar uma jaquetinha, um chapeuzinho e um par de sapatos.
E saindo de casa
começou a correr, todo contente e alegre. De repente porém, viu um lindo
caracol que vinha saindo de uma sebe.
— Eu sou empregado da
Fada dos cabelos azuis — disse o Caracol.
— Onde está a minha
boa Fada? — gritou Pinóquio. — O que ela está fazendo? Ainda se lembra de mim?
Posso ir visitá-la?
O Caracol respondeu:
— A pobre Fada está
numa cama de hospital!...
— De hospital?
— Infelizmente.
Atingida por mil desgraças, adoeceu gravemente e não tem mais sequer o dinheiro
para comprar um pedaço de pão.
— É mesmo?...
Pobrezinha da Fada!... Se eu tivesse um milhão ia correndo levar para ela. Mas
eu só tenho esses quarenta tostões que aqui estão, e estava justamente indo
comprar uma roupa nova. Tome, Caracol, e vá logo levá-los para a minha boa
Fada.
— E a sua roupa nova?
— Que me importa a
roupa nova? Eu venderia até esses trapos que visto, para poder ajudá-la! Ande,
Caracol, e depressa. E daqui a dois dias, volte aqui, que espero poder lhe dar
mais alguns tostões. Até agora trabalhei para sustentar meu pai, de hoje em
diante trabalharei cinco horas mais, para sustentar também a minha boa mãe.
Adeus, Caracol, e espero você daqui a dois dias.
Aquela noite, em vez
de ficar acordado até as dez horas, Pinóquio ficou acordado até depois da
meia-noite, e em vez de fazer oito balaios de junco, fez dezesseis.
Depois foi para a
cama e adormeceu. E, dormindo, pareceu-lhe ver em sonho a Fada, linda e sorridente,
que, depois de dar-lhe um beijo, disse assim:
— Muito bem,
Pinóquio! Graças ao seu bom coração, perdôo-lhe todas as travessuras que você
aprontou até hoje. Os meninos que cuidam amorosamente dos pais nos seus
sofrimentos e nas suas enfermidades merecem sempre muitos elogios e muito
afeto, mesmo quando não podem ser citados como modelos de obediência e de bom
comportamento. Crie juízo para o futuro e será feliz.
Nesse ponto o sonho
acabou, e Pinóquio acordou de olhos escancarados.
Agora, imaginem a surpresa
dele quando, ao acordar, percebeu que não era mais uma marionete de madeira,
mas havia se tornado um menino como todos os outros. Deu uma olhada ao redor e,
saltando da cama, encontrou já preparada uma linda roupa nova, um boné novo e
um par de botinhas de couro que eram uma beleza.
Assim que se vestiu,
pareceu-lhe natural meter as mãos nos bolsos, e encontrou um pequeno
porta-níqueis de marfim, no qual estavam escritas estas palavras: "A Fada
dos cabelos azuis devolve ao seu querido Pinóquio os quarenta tostões e muito
lhe agradece por seu bom coração". Aberta a carteira, em vez dos quarenta
tostões brilhavam ali quarenta moedas de ouro, novinhas em folha.
Depois foi se olhar
no espelho. E pareceu-lhe ser outro. Não viu mais refletida a imagem da marionete
de madeira a que estava acostumado, mas a imagem esperta e inteligente de um
bonito menino de cabelos castanhos e olhos azuis, com ar radiante de
felicidade. Pinóquio não sabia mais se estava de fato acordado ou se continuava
sonhando de olhos abertos.
— E o meu pai onde
está? — gritou. E entrando no quarto ao lado, encontrou o velho Gepeto, que,
sadio, animado e de bom humor como antigamente, havia retomado sua profissão de
entalhador e estava justamente desenhando uma linda moldura cheia de folhagens,
flores e cabecinhas de animais. — Tire-me uma curiosidade, paizinho: como se
explicam todas essas mudanças repentinas? — perguntou Pinóquio.
— Essas mudanças na
nossa casa são merecimento seu — disse Gepeto.
— E o velho Pinóquio
de madeira onde será que se escondeu?
— Olhe para lá —
respondeu Gepeto. E indicou-lhe uma grande marionete encostada numa cadeira,
com a cabeça virada para um lado, os braços pendentes e as pernas de um jeito
que parecia milagre que continuasse de pé.
Pinóquio virou-se
para olhá-la e disse de si para si com grande complacência:
— Como eu era
engraçado quando era marionete! E como estou contente agora que me tornei um
bom menino!...
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